Aventuras em Moçambique


Crônica de um culto numa Igreja em Moçambique” – dia 13/02/2008

Como sempre levantei cedo para ir ao culto. Mas é claro, não precisei me apressar, pois, apesar do horário do culto ser teoricamente às 9 Horas,  está longe de ser essa a prática. Normalmente conto com uma hora e meia de atraso. Havia combinado com as crianças da “zona” (bairro) de fazer uma pequena encenação das duas casas (areia e rocha), e depois cantar a música “A chuva cai”. Por isso fui um pouco mais cedo, isto é, cheguei na igreja às 9.45 Horas. Tive que andar pelo “matope” (lama) e pular poças, com violão nas costas, mais a pasta com “Max” (fantoche), Bíblia, paninho (para secar o suor), água, duas caixas que representavam as “casas”, guarda-chuva, etc....
Cheguei à igreja, onde as crianças já estavam pulando e gritando. Dentro estava sentado o avô de uma das crianças. Sentei com elas e, aos pouos, iam chegando alguns adultos: dois conselheiros, o pregador convidado, e duas mamás. Devido ao barulho das crianças, uma mamá desistiu e foi embora. Cotinuamos esperando. Os tres homens presentes permaneceram sentados nos bancos, lendo a Bíblia. As crianças falavam cada vez mais alto, brigavam, choravam, saíam para comprar “pingos” e chupavam na igreja, saíam para “mijar”, etc...
A barulheira era tanta, que os homens sentados se incomodaram. Então peguei o volão e cantei com elas. Cantamos TODAS as músicas que conhecíamos. Esperamos mais um tanto.... lá pelas 10.45 Horas (eu estava de olho no relógio), chegou o pastor com sua esposa e filhas. Bom...finalmente um dos homens se levantou e começou o louvor. Ao todo éramos 7 adultos e 16 crianças.  Os jovens estavam num encontro em outro Birro.
Após um longo louvor, muito “arrastado” (na minha opinião podiam ter encurtado), um dos conselheiros passou a agenda do culto. Todas as saudações foram feitas “não esquecendo” de ninguém. A agenda estava completa. Nada foi deixado fora...a não ser os jovens. Mesmo com tanto barulho de crianças, o culto iniciou. Graças a Deus, “alguma coisa andou”... e começou pela apresentação das crianças. Eu não me apressei, uma vez que as crianças eram a maioria. Tirei até “Max” da pasta e deixei ele um bom tempo conversando.
Após isto, mais um tempo de louvor e testemunhos.  Depois o pregador convidado, de uma Igreja com um nome estranho, pregou sobre o “Espírito Santo”. Enquanto ele falava eu tentava apaziguar as brigas. Eu estava sentada no primeiro banco e a maioria das crianças queria sentar do meu lado. Elas se brigavam. Um meino de um ano só chorava, até gritava, e incomodava o culto. Ele estava sem mãe, na keka de sua irmã, de aproximadamente 10 anos. Eu queria carregá-lo, mas ele tinha muito medo de “muzunga” (branca).
Bom, acabou a pregação, e, como sempre, o pastor subiu ao púlpito para a segunda mensagem. Para minha “sorte”, os dois foram rápidos.
Qaundo era 11.30 Horas, chegou o “Pai Conselheiro” (o mais velho) , não lembro do nome, com sua esposa. Interessante foi observar que a esposa, a mamã, foi procurar o lugar de sempre no primeiro banco (que normalmente é reservado para algumas senhoras, esposas de pastores e conselheiros). Justamene eu estava no banco dela com aquele bando de crianças lutando por um lugar. Ela então veio, pediu licença e se sentou.
O “Pai Conselheiro” também queria falar algumas palavras, mesmo estado o culto no fim. 

Após a oferta e oração, então, terminou o culto, às 11.45 Horas. Aompanhei as crianças por algum trecho pela rua. Elas vieram todas do mesmo Bairro, um pouco longe da Igreja, sem pais, acompanhados de uma adolescente. A briga continuou na rua, pois alguns queriam segurar minha mão. Um menino brigou com o outro e disse: “Você já segurou na mão de branco, eu não!!”          

O DIA EM QUE “FUI COMPRADA”
Estava em Moçambique por 6 meses para um trabalho missionário. Como havia saído do país com o visto de “uma entrada”, precisei renová-lo.  A melhor maneira que encontrei foi embarcar num *chapa (*uma van que é o meio de transporte rodoviário mais comum) e viajar ao Zimbaue que ficava distante da Beira 4 horas de viagem. Saí cedo e aproximadamente às 10h cheguei em Mutarare, na fronteira com Zimbaue. Antes de desembarcar perguntei ao motorista a que horas iria voltar para Beira. O motorista, percebendo que queria voltar no mesmo dia, falou que voltaria às 14h. Mas acrescentou que esperaria uns minutos para que eu possa voltar com ele.
Eu passei a fronteira e logo em seguida voltei pela imigração para pegar o visto. As filas eram longas e levou algum tempo. Quando cheguei na *paragem de chapas, (*parada) para o caminho de volta, o chapa já não estava mais. Havia ali um jovem de moto que parecia saber (não sei como) do combinado com o motorista do chapa. Ele logo me contou que o chapa havia partido há uns 5 minutos.
Enquanto fiquei aí para sem saber o que fazer, os cobradores de outros chapas começaram a me chamar. A informação que me deram foi que não havia mais outro que fosse até Beira. Que o que fora embora era o último. Poderia ir até Chimoio, a cidade capital mais próxima e pernoitar ali. A chuva ameaçava cair e os rios já estavam ameaçando enchentes nas estradas. Foi então que um dos cobradores me puxou pelo braço e disse: Chega aqui, vamos à Beira! – Ele quase me empurrou para dentro do chapa. Eu me acomodei. Ainda não havia ninguém além de mim. Eu sabia que poderia levar um bom tempo, pois os chapas só partem quando estão lotados – tipo “sardinha em lata”. - Após uns 20 minutos de espera, eis que aparece entre uma nuvem de pó o chapa que já havia partido. Soube depois que o motoqueiro havia entrado em contato com o motorista através do celular. Ele parou e o cobrador saltou do veículo gritando:
- Essa branca é nossa passageira! Venha!
- Não, ela vai conosco! – gritou o outro cobrador.
- Tua não vais à Beira! Estás *adrabando! (*enganando) Argumentou o cobrador.
- Vamos sim! – revidou o outro.
Então o cobrador foi até à porta onde estava sentada para abri-la e me tirar dali. O outro rapidamente se pos na frente da porta impedindo a passagem. Então eles se ameaçaram e começou um bate-boca. Até trocaram tapas.  Eu fiquei apavorada. Quando era adolescente, já sonhei que estava sendo cortejada por dois lindos jovens que lutaram por mim. Agora, com quase 50 anos de idade, estava acontecendo na minha frente, mas com bem outros motivos, nada românticos. Em meio à briga aconteceu algo que jamais esperava de um moçambicano. O cobrador (do chapa que voltou) tirou uma nota de 10 meticais e disse: Pago 10 paus para a  branca voltar conosco.
- “Extá” bem! Pode levá-la! – concordou o outro cobrador e abriu a porta.
Fui literalmente comprada por 10 meticais. Por que? Não consegui entender. Dentro do chapa, já de volta para Beira, meditei sobre o acontecido e lembrei-me de que há muito tempo atrás também fui “comprada” por um preço. Não por dinheiro mas pelo precioso sangue de Jesus.
1 Coríntios 6.20.